Escola Municipal Hospitalar e Domiciliar Irmã Dulce leva educação a alunos com problemas graves de saúde

03 de mar de 2023 - Jornalismo

 

Na Escola Municipal Alto da Cachoeirinha Nelson Maleiro, no bairro do Cabula VI, o garoto Vinícius Santana, de 10 anos, tem, pela primeira vez, a experiência de estudar em uma sala de aula. Aos três, ele chegou a assistir ao primeiro dia de aula, mas teve que se afastar em razão dos problemas de saúde. Com Síndrome de Loeys-Dietz do tipo quatro, o menino só conseguiu voltar à escola regular graças a uma cirurgia inédita, realizada no ano passado, em que ele recebeu um marca-passo diafragmático para auxiliar na respiração sem necessidade do cilindro de oxigênio.

Vinícius chegou à unidade de ensino no Cabula já no 5º ano do Ensino Fundamental. A evolução na vida escolar foi possível graças a uma outra escola municipal, que tem garantido a educação a crianças, adolescentes, jovens e adultos com problemas graves de saúde que os impossibilitam de frequentar a sala de aula. Trata-se da Escola Municipal Hospitalar e Domiciliar Irmã Dulce, cuja sede administrativa fica em Amaralina. A unidade é responsável por fomentar a educação por meio de professores que atuam em hospitais, clínicas, casas de apoio, residências e casas lares, prestando atendimento aos estudantes em processo de tratamento de saúde ou internamento hospitalar.

Com isso, é possível oportunizar um processo educativo que assegure o direito à vida e à saúde, estimulando a escolarização de todos e reduzindo o impacto no fluxo escolar. Hoje, atuam na escola 24 pedagogos, três professores de música, uma coordenadora pedagógica, além de uma vice-diretora e uma diretora. O trabalho é feito em dez hospitais, três clínicas, duas casas de apoio, três casas lares e 16 residências. São 214 alunos matriculados, mas o número de atendidos é muito maior.

De acordo com a vice-diretora Leyliane de Paula Vidal, que há 16 anos atua na área, o trabalho da Escola Hospitalar contribui para minimizar as defasagens escolares durante o período de hospitalização. “Damos continuidade ao currículo escolar do estudante. Sendo assim, ele pode, dentro de suas possibilidades e condições de saúde, ter o mesmo sucesso, aprovação e êxito em avaliações, assim como outros estudantes que estão continuamente na escola comum”, enfatizou.

Foi por meio do trabalho dessa escola que Vinícius estudou dos seis aos dez anos, foi alfabetizado e completou o 4º ano do Ensino Fundamental, com os professores indo até a casa da família para dar aulas a ele.

Ensino regular – A diretora da Escola Municipal Alto da Cachoeirinha Nelson Maleiro, Daniela Palma, conta que é a primeira vez que recebe um aluno oriundo da educação domiciliar. “No meu entendimento, a grande vantagem é minimizar o impacto sofrido por Vinícius em razão das limitações. Com o acesso a uma escola convencional, vamos fazer com que ele tenha uma vida mais sociável, interagindo com as outras crianças. Para mim, é uma alegria porque vemos a conquista que ele alcançou. Fora da cadeira de rodas, do balão de oxigênio, é uma vitória”, declarou.

A rotina da mãe do garoto, Patrícia Barbosa, começa ainda de madrugada, às 4h10. Com a ajuda do filho mais velho, Ícaro, de 23 anos, ela levanta, prepara as medicações de Vinícius e o acorda às 5h, para a primeira rodada de remédios em jejum, antes do café. Às 7h, eles vão para a escola, onde ficam até 11h30. “Quando voltamos, temos mais medicamentos, às 11h30, 14h, 16h, 18h, 22h e o último às 23h. São 22 medicamentos no total. Eu deito para descansar, porque 1h tem mais um remédio. É uma rotina cansativa, mas tudo por ele”, diz ela, que é profissional de enfermagem.

Patrícia conta que foram seis anos de escola domiciliar, e essa experiência presencial ainda a deixa um pouco assustada. “A escola nos recebeu de braços abertos, mas ficamos receosos. Ele é diferente, tem suas particularidades, mas fico tranquila pela receptividade. Vinícius possui outras complicações, como problemas endócrinos, cardíacos, neurológicos, tudo em razão da síndrome, por isso vivemos um dia de cada vez”, contou.

A mãe afirma que ele precisava de ventilação mecânica e não tinha fôlego para caminhar, usando cadeira de rodas para se locomover. “Estou presente aqui todos os dias e vejo meu filho evoluir a cada dia, contando as novidades em casa, o que aconteceu, que tem vários professores. Está descobrindo o mundo. Quando a escola hospitalar chegou lá em casa, o irmão disse sentido: ele nunca vai ter festinha de escola. Mas ele teve! Festinha de aniversário, de São João e final de ano, e agora, em 2023, ele participou da primeira festa de Carnaval aqui, presencial”, afirmou Patrícia.

Animação – O pequeno Vinícius não esconde a animação em estudar em uma escola convencional, e relembra diversos momentos desta experiência. “Está muito bom, eu ainda estou aprendendo, mas a gente vai viver e sempre aprender. O que achei mais legal até agora foi o mini trio elétrico, que fiz até um projeto sobre ele. A festinha de Carnaval foi muito legal, comi pipoca com bolo de cenoura com cobertura de chocolate e chocolate granulado”, contou, animado.

Ele comentou que é muito melhor aprender na sala de aula, porque tem hoje os colegas de sala, e lembra dos cuidados com a saúde sem deixar de lado a diversão.  “Eles brincam comigo, gosto muito de esconde-esconde, mas tomo cuidado com meu aparelho, que uso por 12 horas inteirinhas, pois ele me mantém vivo sem a ventilação mecânica (apontando para a bolsa que guarda a bateria do marca-passo)”, revelou o garoto, destacando seu gosto por matemática e ciências.

A professora Débora Medeiros, inclusive, considera-se privilegiada em ter um aluno como Vinícius na turma do 5º ano. “Para falar a verdade, Vinícius já parece ser aluno daqui da escola há muito tempo. Ele é sociável, se dá bem, interage, participa, tem um interesse grande em aprender. Para mim, é um privilégio recebê-lo como meu aluno”, salientou.

Criação – Iniciativa da Prefeitura de Salvador, por meio da Secretaria Municipal da Educação (Smed), a Escola Municipal Hospitalar e Domiciliar Irmã Dulce foi inaugurada em 2015 e é pioneira no país. Oriunda das Classes Hospitalares, promovido desde 2001 pela Secretaria Municipal da Educação (Smed), a escola diferencia-se por não ser mais um projeto e sim uma instituição de ensino, com quadro próprio de professores, coordenação e gestão. O trabalho ocorre em diversos ambientes, atendendo a alunos que estão impossibilitados de frequentar uma escola convencional por questões médicas.