Escolas da rede municipal promovem inclusão educacional

28 de maio de 2007 - dev

Luiza Torres

Todos os dias a dona de casa Cênia de Almeida sai do bairro Alto do Coqueirinho, próximo a Itapuã, para levar o filho Felipe Almeida Bittencourt, 15 anos, até a Escola Municipal Carlos Murion, localizada em Pituaçu. ‘Filipinho’, como é chamado pelos colegas, é portador de paralisia cerebral e cadeirante. Ao chegar à unidade escolar, o garoto é acolhido pelos demais alunos e professores. Durante as aulas, Filipinho conta com a ajuda dos colegas de sala, que são seus escribas

O estudante Anderson José Pereira, 11 anos, é um dos escribas de Felipe, que tem as mãos atrofiadas e por isso não consegue escrever. Anderson explica que lê as questões dos exercícios escolares para Felipe, que logo aponta a resposta ou dita um texto, no caso de produção textual. “Depois que termino de responder os exercícios, leio novamente para ele. Faço isto para Felipe saber que coloquei a resposta que sugeriu e também se necessitar de alterações na tarefa”, concluiu.

De acordo com a professora Maria das Dores Néri, que leciona na 4ª série, turma de Felipe, o método de fazer de cada criança um escriba, os aproxima e faz com que haja uma interação entre eles. “O nosso papel nesta escola é mostrar para estes alunos que Felipe é um jovem como qualquer outro, só tem apenas algumas limitações que não o impedem de estudar ou de realizar outras atividades. Por isso, todos devem participar do sucesso dele, ajudando nos exercícios diários, participando de brincadeiras, entre outras coisas. Assim, incentivamos os colegas de Felipinho a se tornarem escribas. Cada dia da semana é um escriba diferente”.

Mas Felipe não depende apenas dos colegas para fazer seus exercícios. Nas aulas de informática ele se destaca dos demais alunos e por meio de um mouse especial faz textos no Word e atividades escolares. “Gosto muito desta escola, porque aqui aprendi a ler, escrever, contar e a usar o computador. É muito bom estar aqui”, afirma Filipinho. Porém nem sempre foi assim, pois o apoio que o adolescente encontrou na Escola Municipal Carlos Murion foi negado nas escolas privadas, onde foi matriculado diversas vezes.

A mãe do garoto conta que era muito difícil encontrar uma escola que aceitasse Felipinho como aluno. “As diretoras sempre davam alguma desculpa. Algumas alegavam falta de preparação dos docentes e da infraestrutura, outras simplesmente negavam. Chegava ao extremo até das gestoras escolares se esconderem de mim”. Já as instituições de ensino que aceitavam a dar aulas ao adolescente, deixavam o garoto sempre no fundo das salas, afastado dos outros estudantes. No recreio, enquanto as demais crianças brincavam, Felipe permanecia na sala de aula sozinho, porque as professoras não queriam empurrar a cadeira de rodas até o parquinho ou até a área de lazer infantil. “Hoje meu Felipe não se enxerga como um incapaz, um doente. Ele sabe que tudo é possível, que pode estudar em uma escola regular, que pode ir ao cinema como qualquer adolescente da sua idade e que até no futuro poderá fazer uma faculdade”.

De acordo com a diretora da Carlos Murion, Tereza Cristina Teixeira Silva, a unidade possui 17 alunos com algum tipo de necessidades especiais. Todos estes estudantes estão incluídos na sala de aula normalmente, participando de tarefas, oficinas, entre outras atividades escolares. A diretora explica que cada criança é avaliada segundo as suas possibilidades. “Cada um tem o seu tempo certo para aprender a ler e a escrever, o que não podemos é negar o direito de aprendizagem. Através desta procedimento conseguimos extrair bons resultados”, afirma.

Parque São Cristóvão – A Escola Municipal Parque São Cristóvão é mais uma das 367 escolas da rede municipal que atende crianças e adolescentes com necessidades especiais. No total são 24 alunos com deficiência auditiva, um com Síndrome de Down e dois com cegueira apenas em um dos olhos.

Com os alunos surdos, o conteúdo cientifico é trabalhado separadamente dos estudantes ouvintes a fim de facilitar o ensino-aprendizado. A professora Síria Silva Santos realiza suas aulas em linguagem brasileira de sinais (Libra), mas não foi apenas ela que aprendeu a se comunicar com as crianças, todos os professores, funcionários (merendeiras, vigilantes, serviços gerais) e os demais estudantes da instituição sabem utilizar a linguagem, é o que afirma a diretora da unidade, Jacilene Santos da Silva. Segundo ela, as mães dos alunos que não sabem se comunicar com os filhos também aprendem a Libra, através de um curso promovido pela Parque São Cristóvão.

A estudante Catiane Coutinho Castro, 10 anos, afirmou que aprendeu muito na escola, que tudo é muito divertido, inclusive as aulas de teatro. Já o aluno Wesley Santos, 16 anos, está estudando pela primeira vez e assim como os livros, está tendo contato com a linguagem dos sinais na Escola Municipal Parque São Cristóvão. “O fato dos pais dele não conhecerem a libra dificultou a comunicação do adolescente com as outras pessoas. Hoje, ele já sabe alguns sinais, mas ainda seu vocabulário é muito restrito. Mas apesar das dificuldades que encontramos é gratificante quando eles aprendem, não há dinheiro no mundo que pague esta satisfação”, enfatiza a professora Síria Silva Santos.

Os alunos que possuem paralisia cerebral e Síndrome de Down também recebem um tratamento especializado na escola. É o caso de Luis Henrique Marinho, 8 anos, CEB 2, que tinha uma grande dificuldade em completar as tarefas que exigiam coordenação motora. Apesar da sala de aula conter 24 alunos, a professora Cleide Mota trabalha de maneira individualizada com cada estudante. Graças a este método, Luis já consegue fazer os exercícios.

No total, a rede municipal tem cerca de 1300 alunos com algum tipo de necessidade especial. O secretário municipal de Educação e Cultura, Ney Campello afirma que o Programa Educação Inclusiva: direito à diversidade está voltado para gestores e educadores e tem como objetivo sensibilizar e formar multiplicadores para a transformação dos sistemas educacionais inclusivos. Segundo o secretário, foram estabelecidos convênios e parcerias com algumas instituições especializadas e ONGs a fim de oferecer formação continuada para os docentes, encaminhar as crianças para consultas e exames periódicos e outros atendimentos. “No início deste ano recebemos do MEC um documento parabenizando o município de Salvador pelo sucesso obtido na implementação de um sistema educacional inclusivo, apontando a evolução das matrículas de 175%. Portanto, acredito que estes projetos são importantes para o desenvolvimento da rede municipal de ensino”.