Mostra da EM do Calafate celebra a história e o legado africano sob a ótica do matriarcado

12 de dez de 2023 - Jornalismo

O pátio da Escola Municipal do Calafate (GRE São Caetano) era uma festa só na quinta-feira, 30 de novembro. Mães, pais, avós, irmãos, primos, vários parentes e amigos dos alunos da unidade passeavam encantados entre os stands da 5ª Mostra Pedagógica da Escola – uma exposição de artes, saberes e pesquisas desenvolvidos no decorrer do ano letivo. O projeto que norteou esses trabalhos foi construído no âmbito do conteúdo programático História e Cultura Afro-Brasileira, instituído pela lei 10.639/2003, e recebeu o título de “O Matriarcado – Que cuida, educa e alimenta”.

“Escolhemos esse tema para trabalhar tanto a ancestralidade e os saberes dos países africanos, quanto para incluir uma abordagem para contemplar as mulheres: importância histórica e social, respeito e desafios”, diz a gestora Andreia Santana. Ela conta que a cada ano a temática é definida a partir de demandas da comunidade. “Somos uma escola viva, com um importante diálogo com as famílias e moradores dessa área. Assim, construímos nossas pautas com base nos anseios identificados por meio dessa convivência”, afirma, ressaltando a dedicação e empenho dos professores, coordenação e toda comunidade escolar.

O tema foi dividido em subtemas distribuídos entre as turmas. Assim, toda a escola se envolveu nos estudos sobre as matriarcas em tempos históricos, o Matriarcado Azeviche, os desafios atuais e a história das baianas de acarajé, das quituteiras e das matriarcas do samba e da moda negra. “Esses assuntos foram trabalhados durante o ano, de forma transversal junto aos componentes curriculares. E mesmo com cada turma focando um tema específico, as ações conjuntas proporcionaram que todos os alunos tivessem contato com os demais assuntos”, afirma a gestora.

Durante a mostra, essa construção comum do conhecimento ficou evidente. As crianças sabiam falar e dar informações sobre quaisquer dos temas trabalhados. As alunas do 2º ano B, Laura Luine Santos, Ana Júlia dos Santos e Mariana Sofia Reis, estavam entusiasmadas e fizeram questão de apresentar não somente as produções delas, como as de outras turmas. A temática do 2º B foi Estética Afro, na qual estudaram a moda negra e marcas baianas como a Negrif e a N’Black. Nas aulas, a turma produziu quadros, roupas de bonecas, braceletes, colares, livros e logomarcas. Dentro desse universo, estudaram figuras geométricas e a história da matemática. “A matemática começou no continente africano, no Egito”, ensinam as meninas, para em seguida falarem de todas as coisas que aprenderam.

As três estudantes, junto com Kaila Graziele dos Santos, do 4º B, também quiseram falar sobre a exposição do 5º ano, cujo tema foi “Desafios do matriarcado nos dias atuais”, que tratou da violência contra a mulher. “É um assunto sensível, mas necessário. A temática foi tratada de forma pedagógica, para conscientizar e promover uma cultura de paz e de respeito à mulher”, explica Andreia. Meninas e meninos trabalharam conceitos como “não é não”, lei Maria da Penha, a valorização e o apreço às mulheres, combate à violência de gênero e ao feminicídio, estratégias de socorro e enfrentamento, entre outros. “Aqui mostra que mulheres muitas vezes sofrem violência só por serem mulheres. Isso é muito errado. Aprendi como usar o símbolo de alerta e também que a lei Maria da Penha existe para nos proteger”, diz Kaila.

A costureira Andréa Sotero, mãe do aluno João Gabriel do 3º ano, estava encantada com a Mostra. “Está tudo maravilhoso, organizado, a equipe bem unida. Essa exposição é a prova do trabalho incrível que é feito aqui na escola.” Ela conta que o filho se envolveu muito com os estudos e a produção dos trabalhos. Entre outros assuntos, João Gabriel estudou folhas medicinais, a história da Rainha Nzinga e as matriarcas do samba. Para Edna de Jesus Alves, avó de Ingrid Vitória, aluna do 4º ano, o evento estava muito bonito e informativo. “Tudo está super bem feito, o que mostra o talento das crianças e das professoras”, disse. “E é muito importante falar dos assuntos tratados aqui: racismo, respeito, valorização da mulher.”

Aos dez anos, Ingrid Vitória Moura falava com domínio do projeto em geral e do tema específico que ela e os colegas trabalharam: As Matriarcas do Samba. “Fizemos maquetes, instrumentos, bonecas do samba, estudamos a biografia das sambistas, como Tia Ciata e Edith do Prato”, relata. Segundo ela, os estudos mostraram histórias que precisam ser visibilizadas, que mostram a importância da mulher em diversas áreas. A estudante citou ainda encontros e palestras realizadas durante todo o ano, no âmbito do projeto, como uma entrevista que realizaram com o grupo Tamos Juntas – uma ONG que presta assessoria gratuita às mulheres em situação de violência.

Além do encontro com o grupo, foram realizadas rodas de conversa com a jornalista Naiara Oliveira, a pedagoga Eliane Boa Morte, doutora em Educação, com contadores de história afro, entre outros. “E nossos alunos foram protagonistas em um debate na UFBA, foram convidados pelo Grupo de Estudos e Pesquisas Erê, da Faced (Faculdade de Educação). Eles deram um show!”, conta a diretora, referindo-se ao seminário Literatura Afro-Brasileira: Experiências Pedagógicas para/com Crianças. Sobre o projeto, ela destaca, ainda, que, ao passo que a escola trabalhou a história do povo negro, a ciência, os saberes, as linguagens e manifestações artísticas, também foram estudados outros componentes curriculares como tipologia textual, porcentagem, multiplicação, gráficos, linha do tempo. “Tudo isso se casa com a filosofia da nossa escola que é ensinar para transformar, é promover o crescimento pessoal e ajudar a construir uma sociedade antirracista, da paz e do respeito”, conclui a gestora.